Guerreiras do Kpop e como os verdadeiros demônios são a insegurança e a culpa.
Análise
Música do filme para ambientação:
INTRODUÇÃO
Recentemente assisti ao filme “Guerreiras do Kpop” disponível na Netflix. Conheci pelas músicas que são bem legais, na minha opinião. Após assistir ao filme ficaram claros alguns problemas na construção dos personagens e no filme em si, mas considerando a proposta e que é bem melhor falar do que há de bom nele, vou ignorar esses problemas aqui.
Caso não fique claro, vou deixar alguns spoilers ao decorrer desse texto, então recomendo que veja o filme antes até para melhor compreensão.
O filme nos apresenta o trio de protagonistas com foco maior em Rumi, a vocalista do grupo de kpop. E é nela que vou concentrar minhas análises, juntamente a Jinu, o seu suposto antagonista.
Rumi e suas amigas são guerreiras que combatem demônios e os aprisionam por meio do poder da música. Já Jinu, é um demônio enviado para vencer as garotas no seu ambiente mais vulnerável, a música. Jinu monta uma boy band de demônios para roubar os fãs das garotas, fragilizando assim, a barreira que aprisiona os demônios.
RUMI E A INSEGURANÇA
Rumi carrega consigo um grande fardo desde a sua infância. Ela é parte demônio, e a mulher que a criou faz questão de que ela esconda esse fato de todos que ela ama. A insegurança de Rumi quanto ao que ela é está tanto na trama quanto no visual, os demônios são representados por marcas roxas que Rumi faz de tudo para esconder.
A insegurança de Rumi, representada por suas marcas, cresce cada vez que ela sente vergonha ou insegura quanto ao que é, chegando em seu ápice no clímax do filme, onde suas amigas descobrem que ela é parte demônio.
A analogia aqui está clara, a necessidade de Rumi de se esconder e lidar com a possibilidade de ser descoberta é o maior problema da personagem. Não porque há algum problema no que ela é, mas porque a ensinaram a se envergonhar disso mesmo que o que ela é (parte demônio) não afete o principal: a sua personalidade e índole.
Rumi ser parte demônio representa nada mais que uma característica julgada por quem a criou. É nada mais que um detalhe que faz de Rumi diferente, mas como aqueles que são diferentes como ela são ruins (em maioria), ela deveria se envergonhar de ser também. O que é um julgamento raso, que ignora a individualidade dela.
JINU E A CULPA
Jinu por sua vez, já é um demônio completo, marcado pela culpa de um erro passado. Uma atitude egoísta da qual ele não consegue se perdoar. Jinu é a representação do que a fuga da responsabilidade pode gerar. O objetivo de Jinu, durante todo o filme, é fugir das vozes que o culpam pelo que ele fez, aqui representadas pelo Rei Demônio Gwim-Ma. Ele não consegue lidar com sua própria culpa e foge da responsabilidade que tem quanto ao que fez. Assumindo que é um ser ruim e que não merece redenção porém, ainda assim, fugindo de seu castigo, numa contradição digna da humanidade.
Jinu tem sua principal redenção quando enxerga, através de Rumi, que suas ações não o definem como todo, o seu erro foi horrível, de fato, mas se arrepender é o que ele precisa para seguir em frente. Porém, por grande parte do filme a culpa, novamente representada pelo rei demônio, o impede de crer em qualquer chance de redenção.
No fim do filme essa redenção finalmente se consuma, quando Jinu se coloca a frente do Rei Demônio para defender Rumi. Não só encarando a sua culpa e responsabilidade mas como também defendendo alguém em detrimento próprio, o que simboliza sua redenção quanto ao seu erro do passado.
Jinu representa a jornada de alguém que, devido a culpa, não consegue seguir em frente, não por um fardo imputado, como Rumi, mas por um erro próprio. O que torna tudo pior. Sua visão negativa de si mesmo o impede de prosseguir e se entender como alguém digno.
O REI DEMÔNIO NAS NOSSAS VIDAS
Muitas vezes deixamos as vozes da nossa cabeça nos dizerem o que somos, o que merecemos e o quanto erramos. E mesmo que essas vozes pareçam vir de dentro de nós, muitas delas tem origem em lugares que nem imaginamos. Um bullying na escola, um julgamento de seus pais ou cuidadores ou até mesmo um erro do qual você nunca conseguiu superar. Mas a verdade é que nossa mente (desculpe a repetição) muitas vezes mente. Nós não somos a raiz da verdade, e muito menos temos plena consciência do que somos.
Muitos dirão para acreditar em si mesmo, mas hoje eu trago a reflexão. Quando tudo que nos dizemos é negativo, não seria prudente duvidar de nós mesmos? Não estaríamos escutando, na verdade, o Rei Demônio? As nossas marcas, que escondemos com tanto afinco, muitas vezes não são problemas tão grandes, mas nossa culpa e insegurança as transformam em demônios que nos vemos impotentes ao encarar.
E você? Quantas marcas Você tem deixado dominar a sua vida?
SE TORNANDO LIVRE
Há uma música no filme que representa bem o dilema dos dois personagens abordados (está linkada no começo do post), ela se chama “Free” e é um dueto de Rumi e Jinu.
A música retrata a insegurança sufocante que Rumi sofre. “Eu tentei me esconder, mas algo quebrou” diz a letra em uma tradução direta. Já Jinu relata como Rumi rompe com a sua visão negativa de si mesmo e reacende a esperança em seu coração. “Você está rompendo toda a escuridão em mim” novamente citando a letra.
O refrão entra com a lição que os dois precisam aprender durante o filme: “E se nós tentássemos lutar contra o que estamos fugindo? Não podemos consertar se nunca enfrentarmos.” O dilema dos personagens está em encarar a verdade que tanto fogem. Rumi oprime parte de quem é, como se corresse de sua própria sombra. E Jinu ignora sua chance de redenção enquanto foge das consequências de suas atitudes.
Ambos só se sentem verdadeiramente livres quando podem compartilhar (um meio de enfrentar) seus segredos ou, para entrar na temática, suas marcas. Só é possível se livrar de um fardo o encarando de frente. Os demônios igorados permanecem a espreita, é preciso encará-los de frente.
A jornada de Rumi e Jinu demonstra como mesmo estando acompanhados, se não somos verdadeiros com as pessoas a nossa volta podemos estar nos aprisionando. A liberdade vem da capacidade de ser verdadeiro com si mesmo e com os outros. Sem fugir do passado, dos seus medos e de quem você é.
Gostei da reflexão e agora, planejo assistir ao filme. Sinto que, em detrimento do que é palatável e comercial, mais filmes superficiais estão surgindo e este pode ser uma boa união entre as duas necessidades (ser comercial, porém com mensagem). Muito bom!
Que análise legal! Muitas pessoas podem julgar que o filme é ruim só pelo preconceito que criaram em cima de kpop ou relacionados. Eu ainda não assisti, mas gostei bastante das suas analogias. Parabéns por compartilhar!